Gestão Haddad pratica o higienismo gentil

26/01/2015

Aliado histórico do PT, o padre Julio Lancellotti, pároco da Igreja São Miguel Arcanjo, na Mooca, coordenador da Pastoral do Povo de Rua e titular do Comitê de Políticas Públicas para a População de Rua de São Paulo, apoiou a candidatura de Fernando Haddad à Prefeitura de São Paulo em 2012. Após a posse, porém, começou a se distanciar e a reclamar da gestão na área de direitos humanos. “A administração Haddad pratica o higienismo gentil”, diz. A seguir, trechos da entrevista ao Estado:

 

● Como avalia a gestão Haddad na área de direitos humanos?

A visão que ele tem de direitos humanos é departamentalizada. Para ele, direitos humanos são algumas atividades, como fazer exposições, palestras e dizer

que vai priorizar a população LGBT. Acha que isso é um programa, mas não é. Os direitos humanos perpassam a vida como um todo. A população de rua está reagindo à ausência de uma proposta clara. Ela quer ter uma solução de moradia. A Prefeitura precisa ter um eixo, em vez de promover ações truculentas e pouco inteligentes.

 

● A Prefeitura é truculenta?

Sim, age de forma truculenta, desintegrada e desarticulada. Por exemplo: em uma ação como a que ocorreu hoje (anteontem) na Mooca, onde estavam as áreas social e de saúde? Na quinta-feira, a PM aterrorizou os moradores de rua à noite (da Radial Leste).

 

● O senhor está frustrado com a gestão de Haddad?

Sem dúvida. Ele não conversa com ninguém. Faz mais de um ano que estive com ele. O prefeito não ouve a população de rua, só os grupos que falam o que ele quer ouvir. Acredito que a administração tem apresentado uma maneira pífia de agir, muito fraca e desarticulada. Isso se reflete em vários níveis de governo. Após dois anos, as ações não chegaram até a ponta. O que ele tem para apresentar como marca? Ciclovias? Faixas de ônibus? Essas não são as únicas coisas de uma cidade. A população em situação  de rua cresce na mesma proporção do crescimento demográfico.

 

● Muitos dirigentes de movimentos sociais acusam os governos do PSDB de adotar uma política higienista com os moradores de rua. Isso se aplica ao Haddad?

Sim. Há dois tipos de higienismo: o gentil e o hostil. A gestão Haddad pratica o higienismo gentil. A população que está na rua é heterogênea. As respostas não podem ser únicas ou em cima de um projeto como o De Braços Abertos. São pessoas com lesões existenciais. Eles são o verdadeiro Big Brother o tempo todo.

 

● O que o senhor espera de Eduardo Suplicy na Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania?

Achei muito interessante tirar o secretário titular (Rogério Sottili) e colocá-lo como adjunto para acomodar o outro que perdeu a eleição. Eu liguei para o Suplicy. A gente confia nele como pessoa. Eu disse: ‘Você não precisava ser secretário, bastava continuar sendo o Suplicy’. Agora ele vai representar a Prefeitura.

 

● O senhor pediu algo a ele?

Que a Prefeitura cesse com as ações truculentas e a questão dos direitos humanos perpasse toda a administração. Que haja uma escuta mais respeitosa desse povo.

 

● Como avalia a gestão dos últimos prefeitos na área?

 

A gestão José Serra foi bastante sofrível. Por incrível que pareça, a do (Gilberto) Kassab foi melhor que a do Haddad.

 

● O senhor faz parte do Comitê de Políticas Públicas para a População de Rua da Prefeitura. Como avalia o trabalho do grupo?

O comitê tem sido inexpressivo e inoperante.

 

Fonte: Estadão