Publicidade se espalha em painéis de LED e põe órgão em alerta em SP

19/07/2018


A luminosidade dos anúncios na avenida Paulista faz saltar à vista nomes como Coca-Cola, cerveja Heinekein e perfume Jequiti. No viaduto do Chá, o painel de LED reveza logomarcas da Lacoste, do McDonald's e também um número de telefone para quem quiser anunciar ali.

 

Desde a implantação da lei Cidade Limpa, em 2007, que restringiu a publicidade em São Paulo, os paulistanos não conviviam mais com anúncios pagos nas ruas da cidade. Agora, nomes e logotipos das marcas voltaram a brilhar em vários pontos especialmente da região central.

 

Usando brechas na lei, algumas peças publicitárias passaram a tomar fachadas inteiras de imóveis, ao custo de dezenas de milhares de reais pagos aos anunciantes.

 

A intensidade da proliferação de painéis de LED acendeu um alerta na CPPU (Comissão de Proteção à Paisagem Urbana), órgão que regula o assunto na capital paulista, formado por representantes da gestão Bruno Covas (PSDB) e da sociedade civil.

 

Os painéis de LED não são proibidos, desde que fiquem dentro da loja, a partir de um metro da fachada. Em tese, as lojas poderiam anunciar produtos e promoções por meio dos luminosos no interior da vitrine —a ideia é que o pedestre só visse quando estivesse próximo do estabelecimento. 

 

Os equipamentos, no entanto, tornaram-se cada vez maiores e mais luminosos. Nos últimos anos, ganharam espaço de destaque nas fachadas em bairros nobres de São Paulo.

 

Estabelecimentos passaram a desenvolver uma arquitetura voltada a fazer com que os equipamentos se tornassem os substitutos dos outdoors, que foram barrados na capital paulista pela lei Cidade Limpa. 

 

Em alguns casos, por exemplo, uma fachada de vidro no primeiro andar garante a visibilidade da marca a distância.

 

Um anúncio em uma dessas plataformas no centro de SP, de 3 metros de largura por 1,5 m de largura, custa cerca de R$ 25 mil por mês. Dependendo do ponto e do tamanho, o preço pode ser muito maior.

 

Especializada em painéis, a empresa LED 10 afirmou à Folha ter notado crescimento do setor. Em seu portfólio, a LED 10 mostra postos de gasolina, lojas automóveis, joalherias e grifes de roupa. “Sempre respeitando o Cidade Limpa”, salientou a empresa, por email.

 

A arquiteta Regina Monteiro, presidente da CPPU e idealizadora da lei Cidade Limpa, explica as regras para este tipo de painel: “Se a loja está fazendo anúncio dos descontos dela, das atividades específicas daquela edificação, ok. Agora, vender publicidade dentro da edificação para você ver da rua, além de ser má-fé, é um golpe na lei e é completamente irregular”, afirma.

 

Regina diz que o aumento do número de painéis de LED será discutido na próxima reunião da CPPU, em agosto. Além disso, o assunto também será contemplado no futuro Plano Diretor da paisagem, que definirá regras mais amplas para a cidade.

 

Um dos pontos onde esse tipo de propaganda mais chama a atenção da comissão é a avenida Paulista. Próximo ao Masp, há um painel de aproximadamente 50 metros de largura, onde são divulgadas diversas marcas de bebidas. A reportagem não localizou o proprietário desse painel.

 

Também na avenida, há um um painel de 7,5 m por 3,3 m, na fachada do Top Center. Entre uma marca e outra, aparece o nome da empresa LedChannel, com o telefone para quem quiser anunciar ali.

 

O perfil da empresa em rede social também mostra painéis menores na entrada dos shoppings Center 3 e Light, ambos no centro. Em um dos posts, é anunciado o início de uma campanha nos painéis externos da avenida Paulista.

 

Rubens Nigro, sócio diretor da LedChannel, afirma que a empresa segue rigorosamente a lei Cidade Limpa. “Se [alguma marca] está no painel [externo], tem alguma ação junto dentro [do estabelecimento]. Às vezes um quiosque remoto, uma questão de panfletagem”, afirmou.

 

O Shopping Center 3 afirmou que “segue todas as exigências e normas estipuladas pela lei”. Já os shoppings Light e Top Center, do grupo Gazit Brasil, afirmaram que cumprem a legislação e não foram notificados de nenhuma irregularidade —o grupo afirma que o contrato que tem com a LedChannel prevê que a empresa obedeça as normas da lei Cidade Limpa.

 

As multas por irregularidades envolvendo publicidade nas ruas da capital paulista subiram neste ano. De acordo com a gestão Covas, no primeiro semestre houve 590 autuações por infrações à lei Cidade Limpa, mais que o dobro do aplicado no mesmo período do ano passado (289).

 

O saldo de multas está acima dos últimos anos, mas nem se compara aos primeiros tempos da lei. Em 2011, por exemplo, chegaram a ser aplicadas 4.591 autuações.

 

A multa tem valores a partir de R$ 10 mil, que aumenta dependendo da metragem da propaganda irregular.

Atualmente, a publicidade nas ruas da cidade de São Paulo é regulada por um modelo que exige contrapartida das empresas. Por exemplo, a iniciativa privada instala abrigos de ônibus e relógios de 

rua e pode explorar publicidade nesses locais. 

 

Questionada sobre a proliferação de novos tipos de anúncio pela cidade, a Otima, responsável pelos abrigos, classificou a lei Cidade Limpa como uma “conquista” e afirma que “prevalecerão os formatos que trazem benefícios reais ao cotidiano das pessoas”. 

 

A ampliação desse modelo é uma aposta da prefeitura para criar banheiros públicos.

 

Conforme mostrou a Folha nesta quarta (18), a gestão Covas aumentou as facilidades para as possíveis empresas interessadas em instalar banheiros públicos na cidade de São Paulo, tentando viabilizar mais interesse no mercado.

 

Pelo projeto original, elaborado pela gestão João Doria (PSDB), empresas poderiam explorar publicitariamente as laterais de banheiros públicos que instalassem e cuidassem. 

 

Por meio de decreto, Covas determinou que os painéis publicitários poderão ser instalados em um raio de até cinco metros das cabines, ampliando assim a área de propaganda e buscando atrair mais parceiros da iniciativa privada.

 

A gestão tucana já havia tentado flexibilizar a lei Cidade Limpa, para permitir anúncios nas marginais paulistanas, o que não ocorreu. 

 

A própria prefeitura também cometeu diversas infrações, instalando anúncios de parceiros comerciais do município em locais proibidos. 

 

Agora, a gestão Covas trabalha para formatar a lei do Plano Diretor da paisagem.

 

Os painéis de LED estarão entre os assuntos discutidos nessa etapa, incluindo questões que vão do tamanho à intensidade dos equipamentos. 

 

“O pessoal fica inventando jeito de dar golpe na lei”, afirma Regina Monteiro, que cita mudanças arquitetônicas nas lojas como exemplo. 

 

“Estão fazendo uma distorção do desenho da fachada [dos comércios]. Estão usando de má fé tremenda [para colocar os painéis]”, afirma a urbanista que idealizou o Cidade Limpa na gestão Kassab.

 

SÓ UMA A CADA CINCO MULTAS FOI PAGA EM SP

De janeiro de 2016 a maio deste ano, a prefeitura aplicou 2.014 multas com base na lei Cidade Limpa, mas só 373 foram pagas. A arrecadação foi de R$ 4,9 milhões, mas se todas fossem quitadas, seria de R$ 21,4 milhões. Em alguns casos há recursos. Quem não paga está sujeito a inscrição no cadastro de inadimplentes ou na dívida ativa.

 

Fonte: Folha de S.Paulo