Queda do desemprego convive com forte deterioração das condições de vida da população mais pobre
20/06/2022
Pesquisa coordenada pela Rede Penssan registra que, em 2022,
33 milhões de pessoas sofrem de insuficiência alimentar grave – ou seja, passam
fome
A taxa de desemprego cravou 10,5% no trimestre terminado em
abril último. Isso significa uma queda de 4,3 pontos porcentuais em relação ao
mesmo período do ano passado, a redução mais forte da série histórica. Não só
nos recuperamos do choque provocado pela pandemia, como voltamos para o patamar
do começo de 2016.
Em 2019, quando a taxa girava em torno de 12%, o presidente
Bolsonaro deu-se ares de especialista, criticou a metodologia adotada e disse
que o índice do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) parecia
ser feito para “enganar a população”. Não se sabe de manifestação do presidente
agora que a taxa caiu.
A notícia é boa, mas não se ouvem as fanfarras. O
comedimento tem razão. A queda do desemprego convive com uma forte deterioração
das condições de vida da população mais pobre. Pesquisa coordenada pela Rede
Penssan (II Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar) registra que, em
2022, 33 milhões de pessoas sofrem de insuficiência alimentar grave – ou seja,
passam fome.
Em relação à pesquisa anterior, de 2020, o número de
brasileiros nessa situação aumentou nada menos que 73%. Nas famílias com renda
per capita inferior a 25% do salário mínimo, a fome foi registrada em 43% dos
casos (era 22,8% em 2020). O índice cai para 3% nas famílias com renda per
capita acima de um salário.
É estarrecedor, não só pelo nível abjeto em que nos
encontramos, como pela velocidade da deterioração. Há quem use a taxa de
desemprego para desacreditar a pesquisa sobre insegurança alimentar. Se o
desemprego cai, por que a fome aumenta?
A fome aumenta porque esse governo se empenhou em desmontar
programas e políticas sociais focados na segurança alimentar, justamente quando
os preços dos produtos agrícolas explodiram. E também porque a queda do
desemprego foi acompanhada pelo declínio da renda, fruto do aumento do trabalho
precário.
A média dos rendimentos reais nos últimos 12 meses até abril
de 2022 ficou em R$ 2.708,50, o valor mais baixo desde outubro de 2013. A massa
de rendimentos reais voltou aos níveis de 2017. Ou seja, a queda do rendimento
médio foi tão grande que o aumento do emprego não evitou a redução da massa de
ganhos.
A fome tem rosto, tem nome e tem endereço. Tem também
origem. Essa catástrofe que nos envergonha deriva da pérfida combinação entre
erros da política econômica e desprezo pelos mais pobres. As consequências
políticas são visíveis nas pesquisas de opinião.
Fonte e Foto: Estadão