Primeiro palácio de governo do Brasil deve virar hotel em Salvador

09/09/2019


Ele foi erguido em 1549 como casa de taipa, onde moraria e trabalharia Tomé de Souza, primeiro governador-geral da colônia. Em 1808, hospedou por 34 dias o rei dom João 6°, que desembarcou no porto de Salvador fugindo das tropas de Napoleão.

 

Em 1837, foi sede da efêmera República Bahiense, proclamada em Salvador após a revolta da Sabinada. Em 1912, foi alvejado por tiros de canhão que partiram do forte de São Marcelo para destituir o governador Aurélio Viana. 

 

Um dos edifícios mais simbólicos do centro histórico de Salvador e primeiro paço governamental erguido no Brasil, o Palácio Rio Branco caminha para tornar-se um empreendimento hoteleiro.

 

governador da Bahia, Rui Costa (PT), aprovou uma Proposta de Manifestação de Interesse do grupo português Vila Galé para desenvolver estudos de viabilidade para transformar o palácio em um hotel.

 

A modelagem do contrato ainda está sendo desenhada, mas o governo vai exigir como contrapartida a recuperação da estrutura do palácio e a manutenção do Memorial dos Governadores. O estudo também prevê a possibilidade de o grupo hoteleiro erguer até três novos prédios no entorno do prédio histórico.

 

“O Palácio Rio Branco é um imóvel que faz parte da história do Brasil, mas está subutilizado. Entendemos que é melhor conceder este patrimônio para a iniciativa privada do que deixar ele se acabar”, afirma o secretário de Turismo da Bahia, Fausto Franco.

 

Para ele, o novo empreendimento pode ajudar a induzir a recuperação e retomada econômica da região do centro histórico de Salvador. Atualmente, o prédio abriga a secretaria de Cultura da Bahia e serve de espaço para eventos públicos ou privados.

 

A história do Palácio Rio Branco remonta a 1549, quando o governador-geral Tomé de Souza desembarcou no local onde seria erguida a cidade de Salvador, concebida para ser a sede administrativa da América portuguesa.

 

Um dos primeiros edifícios da nova cidade foi a Casa dos Governadores, construção em taipa e palha que serviria de morada do governador-geral e sede administrativa do governo. 

 

Desde então, outras três construções se sucederam no local. Em 1663, a casa de taipa virou um edifício de pedra e cal, ganhando ares de palácio. Assim permaneceu até o final do século 19, quando foi novamente reformado e passou a ter uma arquitetura em estilo neoclássico.

 

O palácio foi novamente reconstruído entre 1912 e 1919, depois de ter sido parcialmente destruído e incendiado após bombardeios. Reinaugurado há cem anos, ganhou o nome de Palácio Rio Branco.

 

Até 1972, o palácio foi sede oficial do governo da Bahia. Encravado primeira praça dos três poderes do Brasil, hoje divide o espaço com a Câmara Municipal, a prefeitura e o Elevador Lacerda.

 

Por não possuir mais traços de sua arquitetura original, não é tombado pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), mas especialistas atestam sua carga simbólica e sua importância histórica.

 

Além de abrigar o Memorial dos Governadores, o palácio possui espaços como a Sala Pompeana, com afrescos dos séculos 19 e 20, e a Sala dos Espelhos, em estilo rococó.

 

O Instituto dos Arquitetos do Brasil, seção Bahia, pleiteia o tombamento do palácio desde 2015 e defende o seu uso como para abrigar órgãos públicos ou equipamentos culturais. “É um prédio que, mesmo passando por modificações, tem a mesma idade de Salvador. Faz parte do primeiro núcleo da cidade”, afirma Solange Araújo, presidente do IAB Bahia.

 

Em uma carta aberta, o arquiteto e professor da Universidade Federal da Bahia Mário Mendonça de Oliveira classificou a possível implantação de um hotel no palácio como um acinte à dignidade dos soteropolitanos.

 

“A praça onde nasceu a Cidade do Salvador [...] não pode ter as suas funções completamente subvertidas para atender anseios comerciais menores”, diz o professor, para quem o palácio possui valor transcendental e simbólico.

 

A instalação de um novo hotel deve acontecer em meio a mudanças no setor em Salvador, que nos últimos anos viu hotéis simbólicos como o Othon e o Pestana fecharem as portas, novos empreendimentos surgirem no centro histórico, como o Hotel Fasano e o Fera Palace Hotel. 

 

Parte do setor aponta para um excesso de leitos na capital baiana: são 404 hotéis e cerca de 40 mil quartos, com ocupação média de 62% em 2018.

Do meio político, vieram sugestões de outros usos para o palácio. O secretário municipal de Turismo, Claudio Tinoco, propôs que ele abrigasse a prefeitura. Vereadores defenderam a instalação de museus sobre temas como a Capoeira e a Independência da Bahia.

 

O secretário estadual Fausto Franco, contudo, vê com ceticismo propostas que demandem investimento público e afirma que o estado não tem condições de aplicar recursos próprios no palácio.

 

“O problema é saber quem banca. Se o Itaú ou o Bradesco quiserem apresentar um projeto de museu, ótimo, vamos analisar. Mas, até agora, a única proposta que temos é para um hotel”, afirma.

 

Além do Palácio Rio Branco, outros prédios do centro histórico pertencentes ao governo da Bahia devem ser concedidos à iniciativa privada. O próximo alvo é o Palácio dos Esportes, erguido em 1806.

 

Fincado na praça Castro Alves, o prédio tem sua carga histórica: abrigou o Teatro São João, onde os baianos se amontoavam para ver espetáculos musicais e até conferências do jurista Rui Barbosa.

 

E, assim como Palácio Rio Branco, também foi alvo de balas de canhão em 1912.

 

Fonte: Folha de S.Paulo