5G vai aumentar concentração de internet entre ricos, diz estudo

13/09/2021


Os brasileiros mais pobres convivem com uma qualidade de internet muito abaixo do mínimo aceitável e essa situação deve piorar com a implantação do 5G, que exigirá mais investimentos na construção de antenas de celular e redes no país.

É o que indica um estudo feito pela consultoria Teleco, especializada em telecomunicações, para o movimento Antene-se, que defende mais investimentos na instalação de antenas, especialmente em áreas de baixo poder aquisitivo.

O levantamento, realizado nas principais capitais do país, revelou que, quanto menor a renda mensal —abaixo de R$ 1.650—, mais pessoas precisam compartilhar o sinal de uma mesma antena, o que degrada o serviço de forma significativa, a ponto de praticamente inviabilizar a recepção da internet sem fio na periferia.

Em São Paulo, por exemplo, somente em 20 distritos o sinal da internet móvel é aceitável, reflexo de um compartilhamento médio de uma mesma antena por mil usuários do serviço. Nesses locais a renda média mensal de 85% dos domicílios supera R$ 1.650.

Segundo o levantamento, existem bairros na capital paulista com somente duas antenas para cobrir uma área de um quilômetro quadrado, atendendo, em média, mais de 10 mil moradores.

Com esse nível de serviço, a internet nesses locais é considerada “residual”, segundo critérios técnicos globais definidos pela UIT (União Internacional de Telecomunicações). Ou seja: a captura do sinal emitido pela antena só chega ao aparelho por um milagre.

Isso ocorre em Parelheiros (zona sul da capital paulista), onde mais de 40% dos moradores ganham menos de R$ 1.650. A situação é similar em Perus (zona norte) e Cidade Tiradentes (leste).

Em contrapartida, bairros mais nobres, como Lapa, Pinheiros (zona oeste), Santana (zona norte) e Vila Mariana (sul), contam com mais de dez antenas por quilômetro quadrado, o que torna o sinal aceitável.

Um serviço é aceitável quando menos de mil habitantes compartilham uma mesma antena. Nos EUA, essa média é de 897.

De acordo com Eduardo Tude, presidente da Teleco, nenhuma das demais capitais pesquisadas mostrou níveis aceitáveis de serviço, na média geral. No entanto, devido à distribuição das antenas pelos bairros e distritos, foi possível aferir a qualidade dos sinais de acordo com a distribuição das antenas por esses locais.

Depois de analisar esses dados, foi possível cruzar com o número de habitantes e a renda familiar média nessas áreas.

Esse cruzamento de dados permitiu verificar que, com exceção de São Paulo e Belo Horizonte, as demais capitais (Rio de Janeiro, Salvador, Manaus, Goiânia e Florianópolis) não possuem nível de serviço aceitável para quem ganha mais de 1,5 salário mínimo.

“É nítida a relação entre renda e qualidade do serviço”, disse Tude à Folha. “Evidentemente que as operadoras buscam os clientes com maior poder aquisitivo, mas essa situação mostra também uma dificuldade na instalação dessa infraestrutura.”

Para Tude, apesar de haver uma Lei Geral de Antenas, que facilita a construção dessa rede nos municípios, muitos prefeitos ainda resistem e tentam aprovar regras mais restritivas como forma de garantir seu poder de barganha junto às empresas.

A Lei Geral determina que se uma empresa entrar com um pedido de instalação de antenas e não receber resposta em até dois meses, poderá instalá-la à revelia do município, resultado do chamado silêncio positivo.

Na capital paulista, no entanto, um projeto de lei da Câmara dos Vereadores tentou impor dificuldades.

As operadoras foram a campo e convenceram os vereadores a modificar o projeto. Elas garantem que, se houver qualquer tipo de entrave para obras, a cidade não terá o 5G.

Para a implementação da nova tecnologia, cujo leilão das licenças está previsto para outubro deste ano, as operadoras terão de erguer até dez vezes mais antenas para suportar a velocidade das conexões e a quantidade de dados que trafegarão entre as antenas e os celulares.

“Quanto mais modernas forem as leis municipais de antenas, melhor serão as condições dessa cobertura para a população mais vulnerável", disse Marcos Ferrari, presidente da Conéxis, associação que representa as empresas do setor.

"Os desertos digitais poderiam não existir caso os recursos dos fundos setoriais tivessem sidodevidamente aplicados na sua finalidade de executar políticas públicas de conectividade.”

Fonte: Folha de S.Paulo