Famílias compram mais, mas melhora consistente do consumo depende do mercado de trabalho

24/01/2020


Num movimento ainda tímido, as famílias brasileiras começam a superar os estragos provocados pela crise econômica e a retomar lentamente hábitos de consumo que foram deixados de lado nos últimos anos.

 

Mas o quadro atual ainda está distante do 'boom' de consumo vivido pelas famílias no início dos anos 2000 e uma melhora mais consistente deve se concretizar apenas com a retomada mais forte do mercado formal de trabalho.

 

O consumo das famílias foi um dos motores da atividade econômica no ano passado – impulsionado pela liberação de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) – e deve seguir com esse papel. No biênio de 2019 e 2020, a expectativa é que o consumo cresça entre 2% e 2,5% em cada ano, segundo bancos e consultorias consultados pelo G1.

 

"Nos principais indicadores, já há uma trajetória de recuperação do consumo", afirma Alessandra Ribeiro, economista e sócia da consultoria Tendências. "O desempenho do consumo dentro do PIB deixa evidente essa recuperação."

 

Uma série de fatores tem contribuído para que os brasileiros comprem mais: os juros estão mais baixos, há um avanço acelerado do crédito para pessoa física e o mercado de trabalho dá sinais de melhora, embora ainda tímido e calcado na informalidade.

 

Em 2020, essa combinação ainda deve ser favorecida pela melhor composição do emprego no país, com um aumento da formalização. O Itaú, por exemplo, projeta que neste ano serão criados 881 mil empregos formais no país – número próximo ao da consultoria LCA, que espera cerca de 800 mil novas vagas no ano. Para 2019, o banco estima que a abertura de postos com carteira de trabalho assinada tenha sido de 553 mil – os dados oficiais ainda não foram divulgados.

 

Os sinais de melhora do consumo começaram a ficar evidentes e a se espalhar por todo o país no segundo semestre do ano passado, segundo um monitoramento feito pela Kantar. No trimestre encerrado em novembro, houve aumento no comércio de todas as cestas e categorias de produtos. O destaque ficou para o setor de bebidas e perecíveis.

 

No mesmo período, as vendas também cresceram em toda as classes econômicas e regiões do país. "É uma melhora que não está restrita só em um grupo, o que mostra uma clara tendência de recuperação", diz Ana Simões, gerente de contas da Kantar.

 

A expectativa de melhora no varejo em 2020 já movimentou o negócio das irmãs Amanda Aparecida dos Santos, 25, e Andressa Carolina dos Santos, 17, que têm uma confecção em São José dos Campos. Para elas, 2019 não foi de muitas vendas, mas os pedidos cresceram neste começo de ano e as duas foram até a rua 25 de março, em São Paulo, comprar matéria-prima para abastecer a produção.

 

Cautela predomina

Embora o quadro atual aponte para uma retomada do consumo, uma série de riscos ainda pairam sobre a economia brasileira e podem minar a melhora do orçamento das famílias. Boa parte dos brasileiros, sobretudo os mais pobres, ainda tem uma considerável parcela da renda comprometida com dívidas.

 

O indicador de estresse financeiro das famílias, medido pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), ajuda a entender o quadro de cautela que ainda paira sobre brasileiros. Ele consiste na soma da proporção de famílias que usam algum tipo de poupança para quitar despesas correntes e daquelas que dizem estar endividadas.

 

Nos últimos meses, esse índice deu algum sinal de melhora, mas continua acima dos 20 pontos, um patamar ainda considerado alto pelo Ibre. Em dezembro, na última leitura disponível, ficou em 22,2 pontos. No mesmo mês de 2018, estava em 23,3 pontos. Em junho de 2016, no auge da recessão, chegou a 28,2 pontos.

 

No mês passado, 13,1% dos brasileiros estavam usando algum tipo de poupança para quitar despesas e 9,1% afirmaram estar endividados.

 

Fonte: G1